UVA
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A Viticultura no Brasil
A viticultura, no Brasil, ocupa uma área de, aproximadamente, 78 mil hectares, com vinhedos estabelecidos desde o extremo sul do país, em latitude de 30º 56’ 15’’S, até regiões situadas muito próximas ao equador, em latitude de 5º 11’ 15’’S. Em função da diversidade ambiental, existem polos com viticultura característica de regiões temperadas, com um período de repouso hibernal; polos em áreas subtropicais, onde a videira é cultivada com dois ciclos anuais, definidos em função de um período de temperaturas mais baixas, no qual há risco de geadas; e, polos de viticultura tropical, onde é possível a realização de podas sucessivas, com a realização de dois e meio a três ciclos vegetativos por ano.
A produção de uvas é da ordem de 1,5 milhões de toneladas/ano. Deste volume, cerca de 50% é destinado ao processamento, para a elaboração de vinhos, sucos e outros derivados, e 50% comercializado como uvas de mesa. Do total de produtos industrializados, 42% são vinhos de mesa e 49% são sucos de uva, ambos elaborados a partir de uvas de origem americana, especialmente cultivares de Vitis labrusca, Vitis bourquina e híbridos interespecíficos diversos. Cerca de 7% são vinhos finos, elaborados com castas de Vitis vinifera; o restante dos produtos industrializados, 2% são outros derivados da uva e do vinho.
Pragas e doenças da Viticultura
A videira quando cultivada em condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento de patógenos durante o período vegetativo, está sujeita a uma série de doenças, que podem ocorrer em todas as partes da planta, como raízes, troncos, ramos, folhas, brotos e cachos. Algumas dessas doenças, de natureza fúngica ou virótica, provocam grandes perdas e, frequentemente, tornam-se fatores limitantes ao cultivo, se medidas de controle adequadas não forem adotadas. Dentre as doenças fúngicas que ocorrem em uvas finas de mesa na região de Pirapora, Minas Gerais, destacam-se míldio (Plasmopara viticola), oídio (Uncinula necator), podridões de cachos (Glomerella cingulata, Botrytis cinérea), antracnose (Elsinoe ampelina) e ferrugem (Phakopsora euvitis). Além das doenças fúngicas, as viroses também podem causar sérios prejuízos aos viticultores.
Principal doença fúngica em áreas tropicais, o míldio é também conhecido como mofo ou mufa e pode causar perdas de até 100% na produção. As condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento do paseudofungo são temperatura de 20 ºC a 25 ºC e umidade relativa do ar elevada. A presença de água livre na superfície dos tecidos vegetais, seja proveniente de chuvas, orvalhos ou gutação, é indispensável para que ocorra a infecção.
O patógeno afeta todas as partes verdes da planta. Nas folhas, inicialmente aparecem manchas amareladas, translúcidas contra o sol, denominadas de "mancha de óleo" (Fig. 1). Em condições de alta umidade relativa, na face inferior da folha, sob a mancha de óleo, observa-se um mofo branco que é a frutificação do pseudofungo (Fig. 2). Em seguida, o tecido foliar afetado necrosa (Fig. 3) e, quando o ataque é muito intenso, ocorre a desfolha precoce da planta. Os cachos são atacados desde antes da floração até o início da maturação. Quando o patógeno atinge as flores ou os frutos até o estádio de chumbinho, observa-se escurecimento do ráquis, o cacho pode ficar recoberto por uma massa branca (Fig. 4), secar e cair. A fase de maior susceptibilidade da cultura ao míldio compreende o período entre o início da brotação dos ramos até a fase "grão ervilha". Nas bagas mais desenvolvidas, o fungo penetra pelos pedicelos e se desenvolve no seu interior, tornando-as escuras, duras, com superfície deprimida, destacando-se facilmente do cacho.
O controle preventivo do míldio deve ser iniciado com a escolha do local adequado para instalação da parreira, evitando-se áreas de baixada ou com face sul. Medidas que melhorem a aeração da copa, como espaçamento adequado, boa disposição espacial dos ramos sobre o aramado e poda verde (desbrota, desnetamento, desfolha, desponte, etc.), devem ser adotadas, objetivando diminuir o tempo de molhamento foliar e a disponibilidade de inóculo. Em condições climáticas favoráveis, o controle por meio do uso de fungicidas (Tabela 1) deve ser realizado desde o início da brotação até a compactação dos cachos.
Conhecido também por cinza ou mufeta, o oídio é uma doença de grande importância quando ocorrem temperaturas entre 20 ºC - 27 ºC e baixa umidade relativa do ar.
O fungo desenvolve-se na superfície dos órgãos verdes das plantas como brotos, folhas (Fig. 5) e bagas (Fig. 6), que ficam recobertos por um crescimento branco pulverulento, formando manchas difusas. Flores e bagas pequenas atacadas secam e caem. Outro sintoma típico, é a rachadura das bagas (Fig. 7) mais desenvolvidas com exposição das sementes. Mesmo não ocorrendo fendilhamento, os cachos ficam depreciados, pois a superfície da baga fica manchada.
O controle químico do oídio deve ser realizado, em condições ambientais favoráveis, do início da brotação até a compactação dos cachos. Os fungicidas recomendados, as respectivas doses e os intervalos de aplicação estão listados na Tabela 1. Os produtos a base de enxofre, apesar de eficientes e relativamente baratos, devem ser utilizados apenas quando a temperatura do ar estiver entre 25 ºC e 30 ºC, pois, sob temperaturas mais elevadas, podem causar severas queimaduras nas plantas e, abaixo de 18 ºC, sua eficácia é comprometida.
A antracnose é também conhecida como varola, negrão, carvão e olho-de-passarinho. As condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento do fungo são ventos frios e umidade relativa elevada. Temperaturas de 2ºC a 32ºC permitem que o patógeno se desenvolva, sendo 20ºC a temperatura ótima.
O fungo ataca todos os órgãos verdes da planta (folhas, gavinhas, ramos, inflorescências e frutos). Nos brotos, ramos (Fig. 8) e gavinhas, aparecem lesões arredondadas de coloração cinzenta no centro e bordos negros. Nas folhas, formam-se manchas escuras e circulares (Fig. 9) e, muitas vezes, o tecido necrótico desprende-se da lesão, que transforma-se num pequeno furo. Caso as lesões ocorram nas nervuras, causam a deformação da folha (Fig. 10). Nas bagas, manchas arredondadas tornam o tecido mumificado e escuro (Fig. 11). O ataque do fungo na fase de floração causa escurecimento e destruição das flores.
O controle da antracnose deve ser iniciado na época da poda com a destruição de ramos doentes e com tratamento químico, visando eliminar ou diminuir o inóculo inicial. A proteção do parreiral com o plantio de quebra-ventos também reduz a ocorrência da doença. As pulverizações com fungicidas devem ser realizadas desde o estádio de ponta verde (início da brotação) até a compactação dos cachos. Podem ser utilizados tiofanato metílico, difenoconazole, chlorothalonil, mancozeb, hidróxido de cobre e oxicloreto de cobre.
Podridões do cacho - Glomerella cingulata, Botrytinia fuckeliana e Podridão Ácida
As principais podridões do cacho que ocorrem na região norte do estado do Paraná são a podridão da uva madura, a podridão cinzenta ou mofo cinzento e podridão ácida, que provocam perdas tanto na qualidade como na quantidade da uva produzida. Ferimentos nos frutos favorecem o estabelecimento dos patógenos e adubação nitrogenada em excesso favorece o desenvolvimento das podridões, pois proporciona alto vigor à planta. Essas doenças podem ocorrer simultaneamente no mesmo cacho e, normalmente, provocam murcha e mumificação de parte ou de todas as bagas. Alta umidade favorece o desenvolvimento e a esporulação dos fungos, que se disseminam pela ação do vento, da chuva e de insetos.
A podridão da uva madura é causada pelo fungo Glomerella cingulata, forma conidial Colletotrichum gloeosporioides. Os principais sintomas, observados nos cachos no período da maturação ou em uvas colhidas, surgem como manchas circulares marrom-avermelhadas sobre a película das bagas atacadas que, posteriormente, atingem todo o fruto, escurecendo-o (Fig. 12). Em condições de alta umidade, aparecem as frutificações do fungo na forma de pontuações cinza-escuras, concêntricas, das quais exsuda uma massa rósea ou salmão que são os conídios fúngicos (Fig. 13). Embora os sintomas tornem-se visíveis na uva madura, o fungo pode penetrar em todos os estádios de desenvolvimento do fruto, permanecendo latente até a fase de maturação. Além de alta umidade, temperaturas entre 25 ºC a 30 ºC são condições favoráveis à ocorrência da doença.
A podridão cinzenta, podridão de botritis ou mofo cinzento é causada por Botryotinia fuckeliana, forma conidial Botrytis cinerea, fungo que ataca diversas culturas e pode sobreviver na matéria orgânica em decomposição. É uma doença que ocorre com maior freqüência em cultivares de uvas finas, de cachos compactos e bagas com película fina. No Norte e Noroeste do Paraná o mofo cinzento ocorre esporadicamente nos meses de novembro e dezembro, normalmente associado à podridão ácida. Essa doença também pode causar manchas necróticas marrom-escuras, geralmente nas bordas da folha, e podridão em bagas ainda verdes durante o período de frutificação. Água livre ou umidade relativa acima de 90% e temperatura próxima a 25°C são condições ideais ao desenvolvimento do fungo.
O patógeno pode infectar folhas, flores, ramos, pedúnculo e ráquis. Os botões florais, secam e caem. Se durante a floração ocorrer infecção do estilete floral, o fungo permanecerá em estado latente e o sintoma só aparecerá no início da maturação da uva, quando ocorre o aumento do teor de açúcar e redução do teor de ácidos. Nas bagas de uvas brancas, os sintomas iniciais são manchas circulares de coloração lilás que, posteriormente, tornam-se pardas (Fig. 14). Nas uvas tintas, os sintomas são mais difíceis de serem observados. Em condições favoráveis de umidade, o fungo se desenvolve na polpa, consumindo os açúcares e emitindo órgãos de frutificação que podem recobrir toda a baga, formando um mofo cinzento (Fig. 15). Em estacas armazenadas em câmara de crescimento na produção de mudas por enxertia de mesa, o fungo provoca a doença conhecida como "teia de aranha".
A podridão ácida é causada por um complexo de microorganismos que inclui fungos, bactérias e leveduras presentes na superfície das plantas e sobre material em decomposição. Na região norte do Estado do Paraná, ocorre geralmente nos meses de novembro e dezembro, período quente e chuvoso no qual as uvas estão na fase de maturação, com teor de açúcar acima de 8%.
As bagas afetadas pela podridão ácida inicialmente adquirem coloração marrom-clara e posteriormente escurecem. A polpa se decompõe, o suco começa escorrer pelo ferimento (Fig. 16) no qual se iniciou a podridão e contamina as bagas vizinhas. Após o escorrimento do suco, as bagas secam e escurecem, permanecendo aderidas ao pedúnculo. Nos cachos doentes, se observa a presença da mosca Drosophila, responsável pela disseminação dos microorganismos. Uma das características da podridão ácida é o odor de vinagre proveniente do ácido acético produzido pelas bactérias.
O controle das podridões do cacho deve ser feito por meio de um programa integrado de manejo: adoção de medidas que melhorem a aeração da copa, como espaçamento adequado, boa disposição espacial dos ramos sobre o aramado e poda verde (desbrota, desnetamento, desfolha, desponte, etc.); adubação equilibrada sem excesso de nitrogênio; colheita de todos os cachos para que não mumifiquem na planta; prevenção de ferimentos por meio do controle de doenças como o míldio e de pragas da parte aérea; proteção dos cachos com "chapéu chinês", evitando que as bagas fiquem molhadas em períodos chuvosos na fase de maturação; e pulverizações com fungicidas específicos no final da floração, antes da compactação dos cachos e mudança de cor da uva. Podem ser utilizados fungicidas chlorothalonil, captan, mancozeb e tiofanato metílico. Para a podridão da uva madura ainda podem ser usados tebuconazole, hidróxido de cobre e oxicloreto de cobre, enquanto que para o mofo cinzento podem ser utilizados iprodione e pyramethanil.
Causada pelo fungo Phakopsora euvitis, que tem grande potencial de disseminação, a doença foi inicialmente detectada na Ásia e na América do Norte, sendo constatada pela primeira vez no Brasil no ano de 2001 em municípios da região norte do Estado do Paraná. Atualmente, no entanto, a ocorrência do patógeno já se estendeu aos parreirais de outras regiões vitícolas do país. Ocorre, principalmente, em áreas tropicais e subtropicais onde a severidade da doença parece ser maior que nas regiões de clima temperado. Registros preliminares têm mostrado que cultivares européias (Vvinifera) que cultivares européias (V.vinifera) sofrem menos danos que as cultivares americanas e híbridas.
Os sintomas da ferrugem na videira são lesões amareladas a castanhas de várias formas e tamanhos nas folhas. Massas amarelo-alaranjadas de uredosporos são produzidas na face inferior das folhas (Fig. 17), com manchas escuras necróticas na face superior. Ataques severos do fungo causam senescência e queda prematura de folhas, prejudicando a maturação dos frutos e reduzindo o vigor das plantas no ciclo seguinte.
Para o controle químico da ferrugem da videira, normalmente não são necessárias pulverizações específicas, uma vez que os fungicidas do grupo dos triazóis, utilizados para o controle de oídio, também são eficientes no controle de Phakopsora euvitis. Da mesma forma, estrobilurinas, como azoxystrobin e pyraclostrobin, e diversos fungicidas que contém ditiocarbamatos e chlorothalonil, os quais são utilizados para o controle de míldio e outras doenças, também controlam a ferrugem.
A requeima das folhas da videira foi observada pela primeira vez em uvas americanas (Vitis labrusca L.) e híbridas cultivadas na região de Jales (SP), no início da maturação dos frutos, no ano de 1998 e, no ano seguinte, o problema passou a ser observado também nas cultivares de uvas finas (Vitis vinifera L.), durante o ciclo de formação. A doença provoca a queda prematura de folhas e prejudica a maturação dos frutos, tornando os cachos inadequados para a comercialização. Além disso, compromete a formação e maturação dos ramos para o ciclo seguinte, devido ao menor acúmulo de reservas de carboidratos. No Paraná, essa doença foi constatada a partir de 2004, onde ainda não há, no entanto, constatação de perdas causadas por ela.
Os sintomas iniciais, em cultivares de uvas finas, são lesões castanho-claras com bordos escuros, podendo apresentar anéis concêntricos e halo amarelado bem visível (Fig. 18). Essas lesões, predominantes nos bordos foliares, aumentam rapidamente de tamanho e podem coalescer, cobrindo quase todo o limbo, o que provoca a morte e queda das folhas. A esses sintomas observados nas folhas de videiras, fungos do gênero Alternaria têm sido encontrados em constante associação, embora os testes de patogenicidade ainda não tenham sido concluídos.
Para o controle químico da requeima das folhas, não são necessárias pulverizações específicas, uma vez que os fungicidas do grupo dos triazóis, utilizados para o controle de oídio, também são eficientes no controle de Alternaria sp.
Doenças da madeira ou declínio da videira ou botriodiplodiose - Eutypa lata, Botryosphaeria spp.
Declínio ou morte descendente é um termo genérico que, num conceito mais amplo, designa a morte lenta e gradual de plantas ou partes da planta provocada por agente(s) bióticos ou abióticos. Os principais agentes de declínio da videira identificados no Brasil são Eutypa lata (forma conidial Libertella blepharis) e Botryosphaeria spp. (forma conidial Botryodiplodia theobromae e Dothiorella sp).
Os fungos penetram pelos ferimentos das podas ou outras injúrias produzidas sobre as plantas, se desenvolvem numa ampla faixa de temperatura e são favorecidos por alta umidade. O estresse hídrico e desequilíbrios nutricionais agravam a doença.
Os sintomas, bastante genéricos, são retardamento da brotação após a poda; encurtamento dos internódios; folhas pequenas e mal formadas com pequenas necroses nas margens, redução drástica de vigor, superbrotamento, frutificação irregular e menor número de bagas, seca de ramos e morte da planta. Cancros formados nos ramos velhos e frutificações do fungo, são importantes para o diagnóstico do agente causal. Um corte transversal do ramo na área afetada mostra um escurecimento em forma de "V", contrastando com a parte ainda viva da madeira (Fig. 19).
Para o controle do declínio da videira recomenda-se a utilização de material de plantio sadio; retirada e destruição de ramos podados e partes afetadas da planta, protegendo-se os ferimentos com pasta bordalesa, tebuconazole ou tiofanato metílico; desinfestação das ferramentas de poda com água sanitária. As plantas parcialmente afetadas podem ter suas copas renovadas, fazendo-se uma poda drástica logo acima do enxerto. A redução da ação dos fatores que provocam estresse nas plantas poderá diminuir os efeitos do declínio e, às vezes, até controlá-lo.
Uso de fungicidas no controle de doenças em cultivares de uvas de mesa
As pulverizações com fungicidas nas cultivares de uvas finas de mesa devem iniciar logo após a brotação, quando as plantas entram na fase de maior suscetibilidade às principais doenças fúngicas (Fig. 20), utilizando-se, de forma racional, produtos registrados para a cultura (Tabela 2). Além da escolha do local adequado para implantação da parreira e a adoção de práticas de manejo que melhorem a aeração da copa, a calibração dos pulverizadores é um fator muito importante para o sucesso do tratamento fitossanitário, podendo contribuir para a redução do uso de fungicidas na cultura.
No tratamento químico de doenças em uvas para mesa, deve-se cuidar para que as bagas não sejam manchadas, depreciando o valor comercial do cacho. Para aplicação de fungicidas formulados na forma de pó molhável, após a floração, recomenda-se a utilização de bicos de baixa vazão e a adequação da velocidade de deslocamento do trator, evitando-se o escorrimento do produto.
Embora sejam mais eficazes que os fungicidas de contato, os fungicidas sistêmicos e mesostêmicos, por apresentarem sítios de ação mais específicos, podem induzir o aparecimento de raças resistentes na população dos patógenos. Dessa forma, produtos que possuam ação sistêmica e pertençam ao mesmo grup